DIA
46
São
as pessoas como tu que fazem com que o nada queira dizer-nos algo, as coisas
vulgares se tornem coisas Importantes e as preocupações maiores sejam de facto
mais pequenas.
São
as pessoas como tu que dão outra dimensão aos dias, transformando a chuva em
delirante orvalho e fazendo do inverno uma estação de rosas rubras.
As
pessoas como tu possuem não uma, mas todas as vidas.
Pessoas
que amam e se entregam porque amar é também partilhar as mãos e o corpo.
Pessoas
que nos escutam e nos beijam e sabem transformar o cansaço numa esperança
aliciante, tocando-nos o rosto com dedos de água pura, soltando-nos os cabelos
com a leveza do pássaro ou a firmeza da flecha.
São
as pessoas como tu que nos respiram e nos fazem inspirar com elas o azul que há
no dorso das manhãs, e nos estendem os braços e nos apertam até sentirmos o
coração transformar o peito numa música infinita.
São
as pessoas como tu que nunca nos pedem nada mas têm sempre tudo para dar, e que
fazem de nós nem ícaros nem prisioneiros, mas homens e mulheres com a estatura
da vida, capazes da beleza e da justiça, do sofrimento e do amor.
São
as pessoas como tu que, interrogando-nos, se interrogam, e encontram respostas
para todas as perguntas nos nossos olhos e no nosso coração.
As
pessoas que por toda a parte deixam uma flor para que ela possa levar beleza e
ternura a outras mãos.
Essas
pessoas que estão sempre ao nosso lado para nos ensinar em todos os momentos,
ou em qualquer momento, a não sentir o medo, a reparar num gesto, a escutar um
violino.
São
as pessoas como tu que ajudam a transformar o mundo.
Joaquim Pessoa
in “Ano Comum” (Ed. Edições
Esgotadas, 2a ed, 2013)
lido por Manuela Caldeira
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