INUNDAR
DE INFÂNCIA
Hoje
acordei sem dia,
a
casa sem lar,
a
cama sem leito.
Hoje
acordei sem mim.
Saí
à rua,
para
me deixar possuir
pela
simples leveza de existir.
Crianças
passaram por mim,
aos
bandos de espantar,
com
folias e desmandos,
nessa
fabricação de milagres
que
é o absoluto brincar.
Dentro
de mim
o
universo se dissolveu
e
um respirar de céu
em
meu peito se inundou.
Seria
a Vida,
seria
o Tempo sem nostalgia,
ou
seria, apenas, a poesia?
Sei
que havia um fluir de rio
lavando
antiquíssimas dores.
E
do cristal de tristeza
que
antes me negava o ar,
desse
nó de vazio,
voltou
a nascer o mar.
Mia Couto
in
“Vagas
e Lumes”
Lido por Rosário Lemos
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