MATER DOLOROSA
A meus Pais
A mãe do Poeta chora.
E a sua canção inquieta
Parece pedir perdão
Aos homens sem coração
Por ter um filho Poeta...
«Na praia, em pequeno, um
dia
Meteu-se à onda bravia,
Que à flor da espuma
trazia,
Um peixe, cor de luar...
Mas a onda fez-se mansa,
Teve dó dessa criança
Cujo crime era sonhar...
Duma vez à sua porta
Vieram cantar os Reis.
- Ai! a de branco! a de
branco!
Fulvo cabelo, aos
anéis...
Flor, entre os dedos,
singela...
E ele então, logo
perdido,
Foi pela rua, atrás dela,
No rastro do seu
vestido...
Aos vinte anos, cismador.
Esqueceu que havia as
Sortes,
Magrinho, falho de cor...
Por isso os mais, que
eram fortes!)
(Os que tinham ido às
sortes!)
Lhe chamavam desertor.
Em tardes de romaria
Todo o mundo o viu
bailar!
Quando o seu corpo bulia
Subiam torres no ar...
Por fim, calava-se a
dança.
E ele, de novo, sozinho,
Era, de novo, a criança,
Que a onda brava, depois
mansa
Recolhera no caminho...
Formou-se em Doutor de
Leis.
Que pode a idade e os
estudos?
Seus olhos ficaram mudos
A letra ficou nas leis.
Seus olhos só viam
dança...
- Ainda era a mesma
criança
Que ouvira cantar os
Reis!»
E a mãe do Poeta chora.
Com sua canção inquieta,
Parece pedir perdão
Aos homens sem coração
Por ter um filho Poeta...
Pedro Homem de Melo
Lido por Fernanda Oliveira
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