sábado, 27 de junho de 2015

DA COR DO CAJÚ


DA COR DO CAJÚ

Na expressão contida de um rosto negro
que por mim passa, seguro o segredo,
vejo o Cruzeiro do Sul na outra banda
Sagres emergida duma onda que s’agiganta
Cinquenta centavos de castanha de Cajú
a curva da Fortaleza na pesca ao Baiacú,
uma tia abraçando-me com força de mãe
minha avó tomando seu lugar também,
campeonatos ganhos desvalorizada a táctica
braços no ar em companhia enigmática
nos intervalos das aulas passados na cantina
co sonho amante investido de menina
em sadias gargalhadas no átrio do liceu
e tudo o que para trás ficou de meu…

Vejo ‘miscigenação invadindo a metrópole
num monumento que nada deve à Acrópole,
altas serras sobressaindo no deserto
planícies sem dono e eu por cá tão perto
revivendo num quintal eufóricas algazarras
duma vontade adolescente – afiadas ‘garras.
soluços sentidos ao anoitecer tapada a fome
num prato de alerta, aviso que consome
com gritos calados contra a opressão
à minha gente por gentes da mesma nação!

E na expressão de negra sem quitanda já calçada
vejo ainda um passado de tudo ou nada
rio de lama que silencioso desagua
no único mar que banhava  a minha rua
e de imparáveis lágrimas se foi enchendo
a conta-gotas c’enxurradas d’incumprimento…

Nesse mesmo rosto ainda negro de negra
vi sorrisos dum parto e com surpresa
rugas, e um sofrer também por mim
sob a boina distinta da que perdera no capim,
o olhar protector, o colo de aconchego
quando cedo dizia «mãe tardo ou não chego!»

Cito Loio
18/4 a 13/5 de 2015

(19:51)

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