AR
LIVRE
Ar
livre, que não respiro!
Ou
são pela asfixia?
Miséria
de cobardia
Que
não arromba a janela
Da
sala onde a fantasia
Estiola
e fica amarela!
Ar
livre, digo-vos eu!
Ou
estamos nalgum museu
De
manequins de cartão?
Abaixo!
E ninguém se importe!
Antes
o caos que a morte...
De
par em par, pois então?!
Ar
livre! Correntes de ar
Por
toda a casa empestada!
(Vendavais
na terra inteira,
A
própria dor arejada,
-
E nós nesta borralheira
De
estufa calafetada!)
Ar
livre! Que ninguém canta
Com
a corda na garganta,
Tolhido
da inspiração!
Ar
livre, como se tem
Fora
do ventre da mãe
Desligado
do cordão!
Ar
livre, sem restrições!
Ou
há pulmões,
Ou
não há!
Fechem
as outras riquezas,
Mas
tenham fartas as mesas
Do
ar que a vida nos dá!
Miguel Torga, Cântico do Homem, 1950
lido por Maria Helena
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