NASCI
P’RA SER IGNORANTE
Nasci
para ser ignorante
mas os
parentes teimaram
(e dali
não arrancaram)
em fazer
de mim estudante.
Que
remédio? Obedeci.
Há já
três lustros que estudo.
Aprender,
aprendi tudo,
mas tudo
desaprendi.
Perdi o
nome às Estrelas,
aos
nossos rios e aos de fora.
Confundo
fauna com flora.
Atrapalham-me
as parcelas.
Mas
passo dias inteiros
a ver um
rio passar.
Com aves
e ondas do Mar
tenho
amores verdadeiros.
Rebrilha
sempre uma Estrela
por
sobre o meu parapeito;
pois não
sou eu que me deito
sem ter
falado com ela.
Conheço
mais de mil flores.
Elas
conhecem-me a mim.
Só não
sei como em latim
as
crismaram os doutores.
No
entanto sou promovido,
mal haja
lugar aberto,
a
mestre: julgam-me esperto,
inteligente
e sabido.
O pior é
se um director
espreita
p'la fechadura:
lá se
vai licenciatura
se ouve
as lições do doutor.
Lá se
vai o ordenado
de
tuta-e-meia por mês.
Lá fico
eu de uma vez
um Poeta
desempregado.
Se me
não lograr o fado
porém,
com tais directores,
e de
rios, aves e flores
somente
for vigiado,
enquanto
as aulas correrem
não sentirei
calafrios,
que
flores, aves e rios
ignorante
é que me querem.
Sebastião
da Gama
Cabo
da Boa Esperança, 2.ª Ed. (1959)
lido
por Bi Rodrigues
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