FECHOU A
ESCOLA EM GRIJÓ
I
Dantes
ouviam-se as crianças a caminho da escola
e eram
como pássaros de som nas manhãs de Grijó.
Não eram
muitas, mas as vozes joviais
davam
sinal de que a aldeia resistia,
continha
à distância o deserto que a ronda
como a
alcateia ronda uma rês tresmalhada.
Agora as
crianças, todas as manhãs,
são
acondicionadas como mercadorias
numa
viatura com vocação de furgoneta.
Lembram
judeus amontoados
em
vagões jota a caminho de algures.
Vão
aprender em terra estranha o que os seus pais
e os
pais dos seus pais aprenderam em Grijó.
II
Só se
voltam a ouvir ao fim da tarde
quando a
viatura as despeja no largo da aldeia
como
artigos que ficaram por vender.
Mas
ouvem-se pouco, porque vêm cansadas.
Ouvem-se
pouco e triste porque o seu dia
foi
deportado para outra terra onde
não se
lhe firmam as raízes.
O senhor
ministro das Finanças está contente,
porque
poupa meia dúzia de euros
com a
violenta trasfega da infância.
Mas está
triste Grijó, porque já não ouve
as suas
aves de manhã a caminho da escola
– e por
isso pode dizer-se que a aldeia encolheu,
ficaram
uns metros mais perto
as dunas
de amanhã.
III
Caladas
as vozes tagarelas das crianças,
nos dias
de Grijó poucas mais vozes se ouvem
do que
as de alguns velhos que antecipam
em
palavras raras, conformadas,
o dia em
que o silêncio cobrirá com estrondo
o
(des)povoado definitivamente.
O senhor
ministro das Finanças terá poupado
mais
alguns euros com a instauração
deste
opressivo silêncio final,
e ficará
contente.
Grijó
não.
A.M.
Pires Cabral
Resumo,
a poesia em 2013
Ed
DOCUMENTA, Fnac
lido
por Miguel Leitão
Sem comentários:
Enviar um comentário