terça-feira, 13 de agosto de 2019

ANGOLA, ME DIZ AINDA



ANGOLA, ME DIZ AINDA

Angola, me diz ainda
se conheces a plástica vertigem
da lua cheia de nada
vendendo três cucas quinhentos
à porta de casa sentada.

Angola, me diz ainda
a que deus ora a criança
enrolada no seu ventre
enquanto a cidade escancara
janelas de indiferença.

Angola, me diz ainda
quem escondeu o cabrito
que sabe falar inglês
se quem escondeu está podre
de rico e tu vendes água
o saco 50 kwanzas.

Angola, me diz ainda
por quem os silêncios grafitam
palavras como rios
nos muros lisos da noite
palavras interditas
como fome e liberdade.

Angola, me diz ainda
como é que se faz amor
com os olhos desvendados
para as vicissitudes da vida.

Angola, me diz ainda
se a justiça a si mesma
atribui uma dádiva de luto
pela pena capital de Cherokee
Kamulingue e de Cassule.

Ainda me diz ainda,
ó pastorinha das nuvens,
neste Sul do Sara
onde a mão da chuva acumula
o teu sonho de mulher
se te dão nunca alembamento.
.
Angola, me diz ainda
quem que te pôs na boca
o sabor agridoce das maçãs
da índia onde nunca foste.

Angola, me diz ainda
se a inflação também cobra
o valor acrescentado
dos caixotes do lixo
onde os canucos de rua
com os ventres filtrados
pela podridão da cidade
de São Paulo de Loanda
pintam de olhos postiços
este frio 1 de Junho
de dois mil e dezasseis.

Angola, me diz ainda.

José Luís Mendonça
in “Angola me diz ainda”
lido por Luís Oliveira

Sem comentários:

Enviar um comentário