sábado, 25 de agosto de 2018

ATE UM DIA



ATE UM DIA

Quantos kms faz com um litro?
Quanto gasta aos cem?

Eis a preocupação da relação
entre o gasto e a produção,
mas, eis uma nova questão:
quantos poemas se fazem
apenas com uma sopa
ou com um simples pão?

Um carro não anda sem energia!

Barriga vazia faz poesia
da boa?

Quanta poesia
não se faria só com um quilo de broa?

Por acaso,
sim por acaso,
sabeis vós da poesia
das barrigas vazias
dos poetas esqueléticos da Etiópia,
da Eritreia ou do Sudão?

Que poesia há e se lê nesses corpos,
que se arrastam pelo chão?

As pontas dos seus ossos
são lanças
que se cravam nos nossos corpos!

Terão falta de canetas?
falta de tinta?
falta de papel?
informação sobre a rima dos sonetos?

Não,
se desses esqueléticos corpos,
pretos,
o espírito
ainda tivesse força de expressão,
a primeira palavra,
o primeiro verso que diria seria;
-"dai-nos pão"

Povos que vivem de rastos,
sem restos do nosso pão,
enquanto nós;
poetas de barrigas cheias,
fazemos poesia
sobre quem tem barriga vazia,
na Eritreia, Etiópia ou Sudão!

Até um dia,
até um dia.

Até que povos,
que nesse estado estão,
dêem tareia aos poetas de barriga cheia"

Mas,
voltando à questão inicial;
da preocupação da relação
entre o gasto e a produção,
pergunto:
quantos versos os poetas da Etiópia,
da Eritreia ou do Sudão,
não fariam com uma simples sopa,
com um simples pão?

Silvino Figueiredo
in “Pedaços de mim”

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