ATE
UM DIA
Quantos
kms faz com um litro?
Quanto
gasta aos cem?
Eis
a preocupação da relação
entre
o gasto e a produção,
mas,
eis uma nova questão:
quantos
poemas se fazem
apenas
com uma sopa
ou
com um simples pão?
Um
carro não anda sem energia!
Barriga
vazia faz poesia
da
boa?
Quanta
poesia
não
se faria só com um quilo de broa?
Por
acaso,
sim
por acaso,
sabeis
vós da poesia
das
barrigas vazias
dos
poetas esqueléticos da Etiópia,
da
Eritreia ou do Sudão?
Que
poesia há e se lê nesses corpos,
que
se arrastam pelo chão?
As
pontas dos seus ossos
são
lanças
que
se cravam nos nossos corpos!
Terão
falta de canetas?
falta
de tinta?
falta
de papel?
informação
sobre a rima dos sonetos?
Não,
se
desses esqueléticos corpos,
pretos,
o
espírito
ainda
tivesse força de expressão,
a
primeira palavra,
o
primeiro verso que diria seria;
-"dai-nos
pão"
Povos
que vivem de rastos,
sem
restos do nosso pão,
enquanto
nós;
poetas
de barrigas cheias,
fazemos
poesia
sobre
quem tem barriga vazia,
na
Eritreia, Etiópia ou Sudão!
Até
um dia,
até
um dia.
Até
que povos,
que
nesse estado estão,
dêem
tareia aos poetas de barriga cheia"
Mas,
voltando
à questão inicial;
da
preocupação da relação
entre
o gasto e a produção,
pergunto:
quantos
versos os poetas da Etiópia,
da
Eritreia ou do Sudão,
não
fariam com uma simples sopa,
com
um simples pão?
Silvino Figueiredo
in “Pedaços de mim”
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