NECESSITO
DE MIM MAIS DO QUE DE NINGUÉM...
Necessito
de mim mais do que de ninguém. Mas mentiria
se não
confessasse o quanto preciso de ti. Tu és o meu vi-
nho e a
minha ressaca. A minha árvore e a minha floresta.
O meu
cavalo. A minha casa, o meu mar, o meu coral. A
minha
teimosia e a minha lucidez. O meu pássaro de chu-
va e o
meu pássaro de fogo. A minha distância, o meu abis-
mo, a
minha fuga. A minha sombra e o meu túnel. O ata-
lho para
outro lado de mim.
Tu és a
minha estrela e o meu guia. A minha porta, o meu
clarão,
a minha injúria. O meu grão, o meu vento, o meu
moínho.
O meu sortilégio. O fim da festa e o meio dia. O
meu
carnaval, o meu brinquedo, o meu dia santo. O meu
pecado,
a minha penitência. O ouro, a ofensa, o desvario.
És o meu
hábito e o meu monge. A minha espiga e o meu
pão. A
minha irmã branca, a minha irmã negra, a minha ir-
mã de
novas latitudes. A minha amante e a minha mãe, o
meu
abraço e as minhas margens. A minha prostituta, o
meu
combate, o meu sorriso. Tu és o meu cálice. O meu
elixir e
o meu veneno. O vinho que dá coragem às medu-
sas.
Necessito
de ti mais do que de ninguém. Mas mentiria se
não te
confessasse o quanto preciso de mim.
Joaquim Pessoa
Lido por Adelina Gomes
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