quinta-feira, 30 de julho de 2015

JUNTO À ÁGUA


JUNTO À ÁGUA

Os homens temem as longas viagens,
os ladrões das estradas as hospedarias,
e temem morrer em frios leitos
e ter sepultura em terra estranha.
Por isso os seus passos os levam
de regresso a casa, às ruínas, à poeira
das primeiras, das únicas lágrimas.

Quantas vezes em
Desolados quartos de hotel
Esperei em vão que me batesses à porta,
Voz de infância, que o teu silêncio me chamasse!

E perdi-vos para sempre entre prédios altos,
Sonhos de beleza, e em ruínas intermináveis,
E no meio das multidões dos aeroportos.

Agora só quero dormir um sono sem olhos
e sem escuridão, sob um telhado por fim-
à minha volta estilhaça-se o meu rosto
em infinitos espelhos
e desmoronam-se os meus retratos
nas molduras.

Só quero um sitio
onde pousar a cabeça.
Anoitece em todas as cidades do mundo,
acenderam-se as luzes de corredores
sonâmbulas onde o meu coração,
falando, vagueia.

Manuel António Pina

Lido por Lourdes Alegria

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