quinta-feira, 26 de junho de 2014

ANUNCIAÇÃO



ANUNCIAÇÃO

Quando nas ruas não houver ciganos
Nem árabes na praia sequiosa,
Nem sereias no mar, nem uma rosa
Se desfolhar nos dedos desumanos,
- Quando as mãos brancas, rudes, que hoje afago
Destruírem na praça estátuas falsas,
Quando o vento varrer lajes descalças
Em torno do meu lago,
Quando o antigo jardim ficar desnudo
Tal qual a serra agreste
Quando o faquir rasgar a sua veste
De púrpura e veludo,
E quando o cisne em último bailado
Exausto se prostrar,
E a sombra e o seu exército pesado
Entrarem no solar;
Ai! quando as naus pela maré salgada
Se afundarem com oiro, vinho e pão,
Quando a volúpia não tiver estrada
E a beleza e a mentira também não,
Quando os lábios das virgens, porto em porto
Ao vento e às nuvens não pedirem nada
(quando a volúpia não tiver estrada!)
Ninguém chame por mim, que estarei morto.

Pedro Homem de Mello
in “Poemas Escolhidos”
lido por Lourdes Alegria

Sem comentários:

Enviar um comentário